quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Runas e Ortografia

Este é um assunto delicado e até certo ponto polêmico, mas que deve ser devidamente abordado.
De vez em quando, nas comunidades de runas no orkut, vemos pessoas que mal sabem escrever o português (ou que se sabem, fazem questão de não demonstrar) e que pretendem ser estudantes de runas, ou mesmo se arvoram como Magos Rúnicos.
Vejam bem que eu não me coloco como defensor das formas tradicionais de escrita em detrimento de neologismos ou desconstrucionismos. Não, não sou um conservador a tal ponto. Não estou aqui me referindo ao uso de gírias e estrangeirismos, ou de norma culta e tudo o mais... não, estou falando de coisas mais simples e básicas, como concordância verbal, acentuação, “s” e “z”, abreviações, internetês, miguxês e erros bizarros de português que demonstram não uma tentativa de reconstrução da língua, mas uma ignorância total desta.
Sim, porque tem gente que abusa dos erros de ortografia a tal ponto de deixar seus posts quase ilegíveis, e mesmo quando legíveis, totalmente ridicularizáveis.
Além das advertências do bom senso contra tal atitude – falhas na comunicação, argumentos razoáveis desconsiderados pelas demais pessoas por estarem mal escritos, falta de clareza na transmissão da mensagem – ainda há os argumentos místicos contra isso, especialmente no caso de um candidato a Mago Rúnico.
A Magia das Runas tem como pressuposto (igualmente que a cabala judaica e os mantras sânscritos) a teoria de que o mundo é constituído de vibração, e que essa vibração está condensada em uma série de letras (runas), que constituem a fala humana. Então ao vibrar as letras certas, na ordem certa, junto com um propósito firme, podem-se causar mudanças mágicas no universo. Esta é a origem da Galdr (literalmente – Canto do Corvo) Magick, a magia das Runas, e também dos mantras hindus (lembra da sílaba ohm?) e da veneração judaica ao modo como estão dispostos os versículos da bíblia.
Em uma magia rúnica, se colocar uma letra fora de lugar a magia acabará não funcionando, no melhor dos casos, ou gerando efeitos negativos aleatórios, na pior das hipóteses. E isso que se aplica tão fortemente na magia prática não deixa de ser verdade quando se aplica na vida quotidiana.
Outro ponto é que dentro da Tradição Nórdica uma das pedras angulares é o conceito de Honra. O universo – e os deuses – responde(m) de acordo com a tua postura. Certa vez o hoje falecido Godhi Medhal Mikit Stór-Ljon Odhinnson (que sua alma esteja se banqueteando no valhalla) disse “se você não se atém às tuas palavras nas coisas básicas do dia-a-dia, como espera que o universo vai confiar nelas quando você for soltar um encantamento???”. Estas sábias palavras, dignas de um verdadeiro Godhi (pra quem não sabe, “godhi” é o título dos sacerdotes da religião tradicionalista nórdica), se aplicam muito bem ao caso. Se você costuma desarranjar as palavras no seu uso quotidiano, teus arranjos mágickos com ela – seja para mágicka, seja para simples divinação – serão severamente enfraquecidos.
Por isso alguém que pretende ser um mago das palavras (seja ele runatál, cabalista ou yogi) deve conhece-las muito bem, sabendo todas as regras básicas de sua utilização, escrita e pronúncia. E ser muito cuidadoso ao escolhe-las.

Citações do havamál:
“saiba como talha-las, etc...”
“perguntar bem, responder corretamente
são as marcas de um homem sábio”
“melhor ficar em silêncio (...)”

Runas e o Caminho Do Norte

É quase praxe na maioria das comunidades sobre runas hoje dizer que para utilizá-las não é necessário seguir/conhecer a mitologia e o misticismo nórdicos. Oras. Mas isso é um disparate!!!

Isso reflete a grande incompreensão reinante sobre o que são e o que significam as Runas. Elas não são só um monte de letrinhas que podem ser usadas para adivinhar o futuro, como pretendem muitos (inclusive utilizá-las para ler o futuro era mesmo uma prática não muito recomendada pelos primeiros textos rúnicos de que se tem notícia... “Nenhum homem pode saber o futuro. É assim que se permite que durmam tranqüilos”, dizia o Havamál). Não, elas são mais que isso: elas são um Mapa do Universo, codificado em um alfabeto, da mesma forma que os judeus codificaram o seu no hebraico e os hindus no sânscrito (alguém lembra do poder da sílaba “ohm”?). Esse mapa foi criado por um povo específico, os nórdicos, e reflete sua estrutura de pensamento. Cada runa, cada pequeno sussurro/mistério (“run” em nórdico clássico significa tanto sussurro quanto mistério ou segredo) é um pequeno arquétipo dessa cultura, um pequeno grande feixe de energia arquetípica condensada.

Se você tentar entender as runas ignorando sua egrégora, sua bagagem cultural, elas poderão até funcionar em aspectos pontuais, mas você certamente perderá a big picture, deixará de captar o principal da coisa.

Runas são, antes de mais nada, uma ferramenta de auto-conhecimento e de auto-iniciação. Uma ferramenta para compreender a si mesmo e a partir disso o universo. “conhece a ti mesmo” é mais que uma frase de efeito gravada em um templo antigo. E essa ferramenta foi forjada de acordo com certos padrões. Se você não se encaixa nesses padrões, a ferramenta não encaixará em você, assim como uma chave Phillips não encaixará em um rebite ou uma chave inglesa em um parafuso de computador.

Dentro do Futhark cada runa combina com as que estão ao redor, formando um mapa, uma história, um quebra-cabeça... varia com o modo como você olhar. Existem diversos ângulos, mas todos eles possuem o mesmo coração: o coração do mercador-guerreiro nórdico, que vive em meio ao gelo, as rochas e o mar, que dá cada passo sempre entre o céu e o inferno, ignorando os dois abismos que se abrem ao lado da navalha. O Mago Rúnico está sempre cavalgando o paradoxo, e o Futhark está estruturado de modo a demonstrar isso.

Existem dezenas de ferramentas como as Runas. O I-ching e o Tarot são apenas dois outros exemplos, um baseado no taoísmo, outro no judaísmo ou no hermetismo, dependendo da vertente. E se você preferir pode até criar o seu próprio (e se for feito com o coração, pode ter certeza que vai funcionar!).

Portanto, se você não gosta do misticismo nórdico, ou não se interessa, ou acha que não é para você... larga mão de ser besta e deixe as runas de lado, e vá procurar outra ferramenta que tenha o teu número! Ou melhor ainda: crie a tua própria!!!